12 álbuns folk lançados por mulheres no primeiro trimestre de 2021
por Maísa Cachos
O ano de 2021 ainda está no começo, mas se vasculharmos bem as produções musicais vamos notar que seu ritmo de entrega está acima da média. Parece que todo mundo está tentando compensar o ano confuso que foi 2020. Seguimos em confusão, mas acho que estamos nos acostumando com ela e tentando produzir mais para ver se conseguimos encontrar o equilíbrio.
Nesse meio tempo, eu passei a prestar mais atenção aos lançamentos feitos especificamente por mulheres. Me identifiquei com uns tantos, me empolguei com outros, me surpreendi com mais alguns. Por fim, reuni esta lista para compartilhar com vocês. Entre veteranas e novatas, indies e tradicionais, aquelas que buscam a paz interior e/ou exterior, entrego aqui 12 álbuns folk lançados por mulheres nesse primeiro trimestre de 2021.
“Revolutionary Love” – Ani DiFranco
Abrimos a nossa lista com o “Revolutionary Love”, da sempre pertinente Ani DiFranco. Em seu novo trabalho, lançado em janeiro deste ano, a artista reafirma a sua poderosa capacidade de dar voz às nossas frustrações e tensões mais profundas, tanto a nível pessoal como político. Aliás, ela mostra aqui que não há como dividir essas duas coisas. Inspirada por “See No Stranger”, um livro da ativista e advogada Valarie Kaur, DiFranco endossa o amor e a compaixão como ferramentas radicais para processar a raiva, a dor e o tumulto. Tudo isso através de arranjos exuberantes que misturam folk, soul e jazz-pop com excelência. Além disso, Ani nos apresenta ainda alguns dos melhores vocais da sua carreira até então. Antes que eu me esqueça, a produção também é assinada pela própria.
“Urban Driftwood” – Yasmin Williams
É comum elogiarmos mulheres cantoras e até compositoras por aqui, mas dificilmente falamos sobre álbuns essencialmente instrumentais. Pois bem, aqui está uma excelente oportunidade de fazer isto. Em janeiro deste ano, Yasmin Williams lançou seu segundo álbum em estúdio. São 10 faixas instrumentais que mostram seu estilo único de tocar violão. Para além disso, suas faixas trazem uma reflexão sobre tudo o que tem assolado o mundo nos últimos anos: pandemia do Covid-19, protestos, tragédias políticas e sociais e por aí vai. Apesar de não dizer uma palavra sequer, seus acordes falam por si só e soam como um calmante para os eventos imprevísiveis que tem nos rodeado. Se você está em busca de um álbum para relaxar a mente ou mesmo ajudar a concentrar no trabalho, “Urban Driftwood” cai como uma luva.
“FLOWERS for VASES/descansos” – Hayley Williams
O tal álbum folk da Hayley Williams foi uma grata surpresa por aqui. Tanta que ganhou uma resenha completa (confira nesse link). A criativa e sempre autêntica líder dos Paramore, nos apresenta aqui uma seleção de canções gravadas durante a quarentena e nas quais ela mergulha bem mais fundo nas suas questões mais íntimas. O álbum sucede “Petals for Armor”, seu primeiro trabalho solo, e reafirma a capacidade de Hayley como letrista de trazer a tona algumas de suas piores sensações. O disco soa honesto, instrospectivo e minimalista. Não bastasse, nesse projeto, a artista se entregou ainda aos instrumentos e toca todos eles. Enfim, é um daqueles trabalhos libertadores para quem o faz e admirável para quem o escuta.
“Cool Dry Place” – Katy Kirby
O novo disco de Katy Kirby, lançado em fevereiro, é daqueles para ouvir em looping. Apesar de trazer letras um bocado íntimas e reflexivas, o álbum soa leve com melodias que, apresentam uma base folk, mas recebem elementos de country, worship, rock e bastante pop. Sua voz límpida e pura é outro ponto agradabilíssimo aqui. Vale dizer que este é o álbum de estreia da artista que cresceu num ambiente cristão e foi descobrindo seu próprio jeito de compor e expor suas ideias. Ao longo de suas nove faixas, Kirby mostra tanto sua sensibilidade melódica quanto sua capacidade de criar sonoridades distorcidas. É daqueles discos que caem bem tanto num dia calminho de verão, recebendo uma brisa na praia, quanto em dias cinzentos quando tudo o que precisamos é de música para dar cor a vida. Ainda por cima é curto, é dar play e deixar Katy, no repeat, a embalar os sentimentos.
“echo” – Indigo Sparke
Mais um disco de estreia por aqui e também lançado em fevereiro! “echo” soa um bocado mais melodramático que a nossa dica acima, ainda assim me cai muito bem. O trabalho de Indigo Sparke é um prato cheio para quem gosta de mergulhar em baladas melancólicas e solitárias. Suas canções são um tanto quanto hipnotizantes e algumas das faixas podem funcionar como mantras. O disco apresenta ainda muito (muito!) reverb e letras sobre mulheres solitárias fumando enquanto caminham por estradas desertas. Vale muito dizer que quem está na produção desse álbum é ninguém menos que Adrianne Lenker (se não a conhece, vá agora mesmo dar play em “Indiana” a minha favorita dela até então). Se você está buscando um disco que usa pouco (voz e reverb) para dizer muito, o eco folk da Indigo é o que você precisa ouvir.
“Good Woman” – The Staves
Sem dúvidas, um dos álbuns mais esperados do ano. Por mim, ao menos. A cada novo single que as The Staves lançavam sobre este novo trabalho, mais eu gostava da versatilidade que elas apresentavam. E então, em fevereiro, nasceu “Good Woman”. São doze faixas perfeitamente autênticas, nas quais elas tanto retornam a sua essência quanto se jogam em novas experimentações musicais. Nesse trabalho, as irmãs Jess, Emily e Camilla reúnem tudo o que viveram desde seu último lançamento, “If I Was” (2014), e transformam superações, transações e tragédias em letras penetrantes. Por vezes, também cínicas e repletas de humor. Tudo isso embalado por arranjos muito mais pesados do que os que elas nos haviam entregado até então. As guitarras, sintetizadores e percussão aqui praticamente as transformam numa banda de indie rock. Mas é claro que ainda há espaço para sua delicada raiz folk. Nem preciso dizer que a harmonia vocal do trio segue impecável. Há ainda a novidade de um espaço maior empregado para os vocais principais da irmã mais nova Camilla. Em suma, se até então, as Staves nos faziam viajar por dedilhados e doçura, nesse novo trabalho elas nos impulsionam com força e potência. É a dinâmica da música. É a evolução do artista. Acima de tudo, são mulheres a fazer isso.
“Girl I Used to Be” – Garrison Starr
Lançado em março deste ano, este é, sem dúvidas, um dos discos que mais me impactou nesta lista. Talvez por sua faixa de abertura “The Devil in Me”, uma canção com toques tradicionais de country-folk em sua melodia e uma letra amplamente confessional. E é exatamente isto que vamos seguir ouvindo nas faixas seguintes desse trabalho. A voz de Garrison Starr é mais um ponto extra, perfeita para narrativas tão honestas quanto as que ela nos entrega nesse trabalho. Podemos dizer que Garrison já conta com uma carreira pra lá de consolidada, colocou canções em filmes e programas de TV (como Grey’s Anatomy e Nashville), sendo até indicada ao Grammy. Mas esse disco soa como uma obra deternimante em sua carreira, um exorcismo de fantasmas do passado que ainda a assombram, uma auto afirmação de quem ela realmente é: uma mulher gay que cresceu em um lar cristão conservador. Como uma autobiografia, ela vai nos narrando sua história e sentimentos, lamentações e desafios da vida, mas sem deixar de lado momentos de força, esperança e busca pela paz interior. Um super álbum para fãs de melodias country-folk, belos acordes, dedilhados e footsteps. Além de uma baita mensagem de superação através destas nove faixas.
“Little Oblivions” – Julien Baker
Eu sou um pouco suspeita para falar de Julien Baker. Ela é um dos nomes femininos do indie folk que mais ouço. Fica lado a lado com Phoebe Bridgers (a próposito, sua parceira no projeto boygenious, que conta ainda com a maravilhosa Lucy Dacus. Vale dizer ainda, que as duas participam aqui na faixa “Favor”). Mas foquemos em seu novo trabalho, “Little Oblivions”, lançado no finalzinho de fevereiro deste ano. Primeiro, chamo a atenção para as narrativas de suas letras e a capacidade dessa mulher tão jovem contar histórias profundas e envolventes de uma forma que soa tão natural. Segundo, o seu vocal puro e altamente cativante. Não há firulas, não há enfeites. É apenas a voz de mulher que tem muito a contar, apesar da pouca idade. E o faz sem abusar da voz. Consequentemente, isso soa tão honesto que consigo ouvi-la como se estivesse ouvindo uma amiga confessar algo diretamente para mim. Terceiro, e encerro com este ponto, temos aqui um álbum melodicamente encorpado. Diferente de alguns de seus trabalhos anteriores, onde tínhamos apenas suas voz e guitarra, aqui contamos com o apoio de uma banda completa que não só encorpa o caldo das canções, como cria texturas falcimente degustáveis. Minha dica com esse álbum, é meter nos ouvidos seu melhor fone e mergulhar na atmosfera de Baker sem medo de encharcar a alma.
“Still Woman Enough” – Loretta Lynn (and Friends)
Até aqui eu falei bastante sobre novatas e indies e algumas das minhas favoritas. Mas vamos fazer jus também ao talento de veterenas incríveis, como é o caso da musa Loretta Lynn. Comemorando os 50 anos de um de seus álbuns mais simbólicos, neste trabalho, lançado em março, ela reúne amigas e parceiras musicais, para dar uma nova vida a alguns de seus clássicos, bem como a algumas canções tradicionais americanas e suas raízes country-gospel. Participam aqui nomes como Reba McEntire, Tanya Tucker e Carrie Underwood, além de Margo Price (que foi apresentada a ela através de Jack White – que produziu um de seus trabalhos anteriores). Sem sombra de dúvidas, Lynn celebra nesse trabalho as gerações de mulheres artistas country, abrindo um caminho para as gerações futuras. É importante dizer também que a maior parte do material foi gravada no Cash Cabin Studio em Hendersonville, Tennessee e co-produzida por sua filha – Patsy Lynn Russell – e John Carter Cash, filho de Johnny Cash e June Carter Cash. Uma união de gerações apenas formidável. O título do álbum é um espetáculo a parte, desafiador e honroso para uma mulher que se aventura num mercado ainda tão machista. Por fim, este é um álbum para conhecermos o passado e desenharmos o futuro, sabendo que no presente continua necessário sermos mulheres o suficiente.
“Chemtrails Over The Country Club” – Lana Del Rey
Taí mais um disco que eu estava muito curiosa para ouvir. Desde o ano passado, boa parte da imprensa musical especulava um novo disco da Lana Del Rey embebedado numa atmosfera folk. E é esse mesmo o caminho que a cantora segue. Aqui, suas faixas melancólicas falam sobre fama, amor e solidão, equanto melodicamente transitam entre o chamber pop que ela representa muito bem e o indie folk que tanto amamos nesse blog. Há alguns acordes mesmo bons, principalmente na segunda parte do trabalho. Vintage, setentista, sexy, ambiental e homogênio, “Chemtrails Over The Country Club” é mais uma prova da versatilidade de Lana. Diferente de alguns de seus trabalhos anteriores, aqui ela se apresenta mais leve, mais mansa e um bocado minimalista, mas sem deixar a sua essência de se entregar de lado. É um álbum agradavél e gostoso de ouvir, principalmente para quem está em transição: serve bem tanto quem ouve pop e quer começar suas audições de folk, quanto quem ouve folk e quer passar a ouvir mais pop. “Not All Who Wander Are Lost” e “Yosemite” são algumas das faixas que mais gostei aqui. Vale dizer que quem assina a produção desse trabalho é o experiente Jack Antonoff, que também atua na produção do aclamado “folklore” da Taylor Swift.
“Who By Fire” (Live Tribute to Leonard Cohen) – First Aid Kit
Este é um álbum que eu não estava mesmo a espera e é apenas fabuloso. Mais que uma belíssima homenagem a Leonard Cohen, neste trabalho as irmãs Klara e Johanna Söderberg do First Aid Kit, nos transportam de volta a magia dos álbuns ao vivo e a uma imersão nas obras de um dos homens mais dramáticos do folk. O álbum foi gravado em 2017, no Royal Dramatic Theatre de Estocolmo, durante um conjuto de shows que aconteceram quatro meses após a morte de Cohen. A emoção de perdermos um ícone como ele é notável em suas vozes e interpretações. O que torna esse álbum ainda mais especial é que aqui não nos deparamos com simples covers de clássicos e lados B de Cohen, mas somos nocauteados por reinterpretações cheias de alma e seladas pela essência das First Aid Kit. Para ajudá-las a encorpar todas as nuances desse trabalho, há ainda um grupo apaixonante de músicos suecos. Ao longo da audição nos deparamos com música, silêncio, declamação de poemas e frases elevadas pela melodia. Melodicamente, há uma constante mudança de violões, pianos, sinos, cordas… É uma vasta experiêcia sensorial para trazer à tona os temas que Cohen sempre explorou: sexo, morte, desespero e, claro, espiritualidade. Sem dúvidas, uma das melhores coisas que ouvi este ano. E não só, na vida. Não há mais nada que eu possa dizer, além de: ouça, ouça e ouça!
“Under the Pepper Tree” – Sara Watkins
O nome da Sara Watkins já é manjado aqui no blog. Se não lembra dela, você tem nos visitado menos que deveria. Sara está envolvida em diversos projetos musicais que amo, a saber: Nickel Creek, Watkins Family Hour (um duo com seu irmão Sean Watkins) e I’m With Her (seu trio com Aoife O’Donovan e Sarah Jarosz). Ainda assim, a cantora, compositora e instrumentista, arranja tempo para se reiventar em seus projetos solo. E em “Under the Pepper Tree”, seu mais recente trabalho lançado no finalzinho de março, ela nos envolve numa espécie de magia musical nos transportando para zonas nostálgicas da nossa mente. Cada acordezinho aqui parecem salpicadas de pó de pirlimpimpim que, apoiadas na doçura da sua voz, nos faz viajar por melodias clássicas da nossa infância. A verdade é que este álbum é feito para crianças, mas não só… Nele, Sara revisita canções que amava quando pequena. Podemos ouvir, por exemplo, uma nova versão para “When You Wish Upon a Star”, do Pinóquio da Disney, e “The Second Star to the Right”, de Peter Pan, mas há ainda “Good Night” dos Beatles e outras canções de cowboy que se encaixaram perfeitamente em seus novos arranjos. Para esse trabalho, ela trouxe seus companheiros e companheiras de projetos. “Blue Shadows on the Trail”, por exemplo, conta com os marvilhosos do Nickel Creek, enquanto “Tumbling Tumbleweeds” ganha harmonias vocais incríveis com suas parceiras do “I’m With Her”. Sua filhinha também participa da forma mais fofa possível nos vocais de “Edelweiss”. Este é um álbum que soa gentil e reconfortante, principalmente nestes dias caóticos nos quais temos vivido. Traz um bocadinho de calor para o coração nos lembrando da simplicidade quando éramos criança e fantasiávamos um mundo perfeito e colorido, no qual éramos felizes para sempre. Recomendo o play para escapar, ainda que por trinta e poucos minutos, da nossa dura realidade.
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