15 lançamentos folk do primeiro semestre de 2020 que você provavelmente não ouviu, mas deveria!

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Não podemos negar que está difícil acompanhar 2020. Todo mês surge, no melhor dos cenários, uma notícia que só mostra que estamos caminhando para o fim do mundo. No pior dos cenários, temos várias notícias que confirmam isso. Não a toa, acabamos por tirar a nossa atenção para as coisas boas que continuam acontecendo. E dentre essas coisas boas estão alguns lançamentos musicais que fazem a gente ter esperança na música, na arte e na vida.

Eu já falei aqui no blog sobre uma frase que vi e adoro “Arte é como decoramos o espaço, música é como decoramos o tempo”. Vamos então decorar um pouco desse ano com estes trabalho que listamos aqui!

“Best of Luck” – Christopher Paul Stelling

Abrimos nossas dicas com “Best of Luck”. Lançado em fevereito, este é o quinto álbum em estúdio de Christopher Paul Stelling e o primeiro produzido por outra pessoa. Mas não qualquer uma. Quem assume a produção aqui é ninguém menos que Ben Harper. Os dois acabaram por alinhar suas ideias musicais depois de alguns shows que Stelling abriu para Harper. O resultado é um disco com as letras ponderadas de Christopher – que aqui estão ainda mais instrospectivas, refletindo, acima de tudo, sobre a quietude e o ato de estar presente, proveitando o agora – e arranjos que passeiam entre o folk, o rock, o soul e um bocadinho de gospel.

Destaque para as faixas: “Have To Do For Now”, “Something In Return” e “Hear Me Calling”.

“LP5”- John Moreland

Lançado também em fevereiro deste ano, “LP5” é o quinto álbum de estúdio do músico americano John Moreland. Como sempre, Moreland mostra sua habilidade em escrever letras poderosas. Ele é um rei quando o quesito é narrativa musical. Mas, se em seus trabalhos anteriores ele mergulhou na dor e escreveu canções tremendamente tristes, aqui ele passeia por novas emoções e até temas de superação, brincando ainda mais com harmonias e experimentações.

Destaque para as faixas: “Easter October”, “In Times Between” e “Let Me Be Understood”.

“All Things Go” – Mighty Oaks

Mais um lançamento de fevereiro, “All Things Go” é o terceiro álbum cheio dos Mighty Oaks, um trio que nasceu de reuniões de um americano, um italiano e um britânico numa sala de estar em Berlim. Depois de lançarem alguns trabalhos e, mais recentemente, acompanharem os The Lumineers numa turnê, a banda apresenta aqui um trabalho mais maduro. Mantendo ainda sua essência indie-folk, aqui eles passeiam também por outros gêneros, apresentando, entre suas narrativas inquietas, uma bonita produção eletrônica com piano, guitarras ritmadas e pitadas de pop.

Destaque para as faixas: “Forget Tomorrow”, “Lost Again” e “Fly To You”.

“And It’s Still Alright” – Nathaniel Rateliff

Outro lançamento incrível de fevereiro foi o “And It’s Still Alright” do Nathaniel Rateliff. Aliás, o primeiro solo dele em anos, desde que se juntou aos incríveis The Night Sweats e alcançou seu grande momento na carreira. A temática do álbum é triste, Rateliff escreveu as letras desse trabalho num período turbulento da sua vida: além de ter passado por um recente divórcio, perdeu repentinamente seu amigo e produtor Richard Swift. Portanto, o álbum pauta-se na melancolia, nas dores e na profundeza da alma do artista. Suas faixas são marjoritariamente íntimas e confessionais, trazendo ele de volta para o folk triste de suas raízes musicais.

Destaque para as faixas: “And It’s Still Alright”, “You Need Me” e “Time Stands”.

“Sister” – Puss N Boots

Ainda em fevereiro, tivemos o retorno do Puss N Boots, um power trio formado por Norah Jones, Catherine Popper e Sasha Dobson que mistura com maestria toques de country, folk e soul. As meninas lançaram seu segundo álbum, intitulado “Sister”, e apresentam faixas nos mais diversos moldes: temos as três tocando instrumentos diferentes, músicas solo que trouxeram para o projeto, letras que escreveram juntas e ainda covers, como é o caso de “Angel Dream” de Tom Petty. O álbum é tanto divertido quanto agressivo e traz de faixas instrumentais, como “Jamola”, que é claramente uma jam entre as artistas, até canções de superação como “Same Old Bullshit”, que nada mais é que um lembrete para aceitar os pontos mais baixos da vida com um encolher de ombros e um sorriso no rosto.

Destaque para as faixas: “It’s Not Easy”, “Sister” e “Joey”.

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“Saturn Return” – The Secret Sisters

E se você acha que fevereiro não teve lançamentos suficientes até agora, deixa eu te falar sobre “Saturn Return”, o quarto álbum em estúdio das The Secret Sisters. Formado pelas irmãs americanas Laura and Lydia Rogers, esse duo tem o poder de nos transportar pra tempos remotos através de suas melodia e harmonias vocais. Nesse trabalho, não é diferente. Aqui, as irmãs continuam contando com o apoio da Brandi Carlile que tem co-produzido o trabalho delas já há algum tempo. A cantora participa, inclusive, da faixa “Water Witch”. Uma das principais diferenças deste trabalho em relação aos anteriores da dupla é o fato delas ocasionalmente fazerem turnos vocais individuais. O tema do trabalho passeia por uma gama de sentimentos: ambas as cantoras foram mães pela primeira vez e também perderam suas avós. Então espere faixas reflexivas de aprendizados e, ainda, do descobrimento da cura e da esperança em meio ao sofrimento. Pitadas de gospel, folk, country misturado ao talento e as narrativas dessas meninas, deixa o trabalho tremendamente apetitoso aos nossos ouvidos.

Destaque para as faixas: “Late Bloomer”, “Fair” e “Healer In The Sky”

“Brother Sister” – Watkins Family Hour

Que o folk está no sangue da família Watkins não é novidade para os mais antenados por aqui. Mas, em abril deste ano, Sara e Sean Watkins trouxeram isso para o título e para o coração de seu novo trabalho juntos. “Brother Sister” é um álbum que reúne dez faixas nas quais podemos ouvir uma baita harmonização de suas vozes melódicas enquanto o violão de Sean e o violino de Sara se entrelaçam. Dentre elas, sete são originais e enfatizam as habilidades de composição da dupla, passando pelas mais diversas histórias, sem esquecer do papel importante do folk ao cantar sobre sobre os problemas sociais, aqui um dos focos são os incêndios florestais da Califórnia. Já as três covers, obiviamente revelam um bocado do que sustenta e inspira a música desses irmãos, como é o caso de “Keep it Clean” que encerra o disco com uma celebração abluesada. A faixa é um clássico de Charley Jordan, gravada ali pelos anos 30.

Destaque para as faixas: “The Cure”, “Miles of Desert Sand” e “Keep It Clean”.

“Song For Our Daughter” – Laura Marling

Também lançado em abril (por força da pandemia, na verdade ele estava programado apenas para agosto), “Song For Our Daughter” é o sétimo álbum cheio de Laura Marling e recebe esse nome porque soa como algo que uma mãe escreveria para uma filha. Como o seu título já nos induz a imaginar, ele é um álbum extremamente íntimo. Segundo a própria Laura, o trabalho é sobre “traumas e uma busca duradoura para entender o que é ser mulher nesta sociedade”. Suas faixas são notas de sabedoria e aprendizado recebidos ao longo da vida. Logo, ele soa extremamente maduro. Muitas vezes, denso. Algumas palavras são duras, difíceis de engolir, não fossem os dedilhados de um violão puro e a voz agradável e serena dessa mulher. De forma incrívelmente bela, Laura consegue traduzir em canções muito sobre a feminilidade moderna, como uma trovadora que representa a heroína diária que cada uma de nós precisa ser.

Destaque para as faixas: “Alexandra”, “Held Down” e “Only The Strong”.

“Pacific” – Roo Panes

Em maio, tivemos o prazer de ganhar o EP “Pacific” de Roo Panes. Trabalho que sucede o aclamado “Quite Man”, lançado por ele em 2018 e que ganhou uma versão deluxe no ano passado. Como é costumeiro de Panes, aqui ele explora suas filosofias através de diferentes narrativas. Chegando em meio ao caos de uma pandemia, obviamente ele foi um dos trabalhos que poderiam soar como calmante. Um play certeiro para acalentar o coração e a mente nos dias mais tulmutuados e pessimistas. Preciso dizer ainda que, ao menos para mim, esse trabalho parece um pouco como uma transição na carreira de Roo. Algumas faixas são mais experimentais com espaço para sonoridades (como é o caso de “Color In Your Heart”) e, consequentemente, sensações pouco exploradas em trabalhos anteriores. Mas a essência de Roo permanece aí: lírica, melancólica e esperançosa.

Destaque para as faixas: “Listen To The One Who Loves You”, “The Sun Will Rise Over The Year” e “There’s A Place”.

“Reunions” – Jason Isbell and the 400 Unit

Ainda em maio, nos deparamos com o fantástico “Reunions”, quarto álbum que Jason Isbell lança com sua banda de apoio The 400 Unit. Cada narrativa aqui parece mostrar um Isbell reencontrando algo ou alguém do seu passado e encarando isto de frente (“It’s Gets Easier”, por exemplo, claramente, o faz encarar as dificuldades que ele tem passado para se manter sóbrio ao longos dos anos). Mais que isso, ele nos faz reencontrar pedaços do nosso passado também e nos encoraja a nos reconciliar com cada um deles. Mas também é evidente que o que ouvimos em suas letras não é exatamente uma autobigorafia. Como o excelente compositor que sempre se mostrou, Isbell precisa de verdade, então toma como base suas histórias para projetar algo bem maior e com o qual nós ouvintes vamos nos conectar. Melodicamente falando, o trabalho é tão excelente quanto algo que podemos esperar quando alguém reúne Jason Isbell e Dave Cobb: várias cordas, harmonias vocais perfeitas, guitarras rasgando as melodias quando conviente e muita alma.

Destaque para as faixas: “Dreamsicle”, “Only Children” e “Be Afraid”.

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“Look Long” – Indigo Girls

Encerrando nossos destaques de maio, não poderia jamais deixar de mencionar o poderoso “Look Long”, décimo quinto álbum de estúdio das gigantes Indigo Girls. Mesmo cantando juntas há cerca de 35 anos, essas duas conseguem nos supreender com seus lançamentos e fazer qualquer noobie no folk se apaixonar por suas canções. Entre baladas melancólicas e faixas mais rítmicas e efevercentes, encontramos a razão pela qual essas mulheres são inspirações para os mais variados artistas que vieram depois delas. Há beleza, há inovação, há tradição e, acima de tudo, há o senso político que sempre guiou a música de Amy Ray e Emily Saliers. Como artistas declaradamente gays, que estão envolvidas com ativismo, as Indigo Girls continuam adicionando peso àquilo que cantam. Eleições, armamento, tiroteios, preconceitos, enfim: toda a turbulência e contradições de ser estado-unidense em 2020 estão explícitas nas faixas desse trabalho.

Destaque para as faixas: “Shit Kickin’”, “When We Were Writers” e “Country Radio”.

“On the Other Side” – Blanco White

Em junho, foi a vez de conhecermos “On the Other Side” o primeiro álbum cheio do britânico John Edwards, mais conhecido como Blanco White. Quem acompanha o nosso blog, já conhece alguns outros trabalhos que costumamos indicar do rapaz. Altamente influenciado por nomes do folk como Leonard Cohen e Bob Dylan, Blanco tem uma paixão evidente pelas coisas da Espanha. Isso emana claramente nas melodias, cordas e atmosfera meio mágicas de suas canções, sempre cheias de texturas e ritmos. Certamente, isso tudo cria uma marca sonora para o músico, o diferenciando de muito do que tem sido feito no indie folk atual.

Destaque para as faixas: “Kuai O’o”, “Olalla” e “Mano a Mano”.

“World on the Ground” – Sarah Jarosz

Sarah Jarosz tem construído uma baita carreira na música folk. Ela já foi premiada por suas músicas, tem um super talento como multi-instrumentista e ainda participa do power trio I’m With Her ao lado das fenomenais Sara Watkins e Aoife O’Donovan. “World on the Ground”, lançado em junho deste ano, é o seu quinto álbum e, claramente, reflete a maturidade que tem construído ao fazer tudo o que faz. Este também é um trabalho que faz Sara olhar mais pra si e para suas raízes. O tema central do álbum é o Texas, de onde a artista origina. Cada faixa acaba se tornando um conto individual sobre a vida e as pessoas do seu estado natal. Sarah mostra ainda, com muita propriedade, sua capacidade de compor narrativas fascinantes, bem como toda a sua mabealidade musical ao apresentar variações que passam pelo country, folk-pop e bonitos arranjos bons de banjo e bandolim.

Destaque para as faixas: “Hometown”, “Johnny” e “Orange and Blue”.

“Punisher” – Phoebe Bridgers

Phoebe Bridgers tem se tornado uma das minhas artistas favoritas na cena indie. Eu já gostava de tudo que ouvia dela, mas ela se juntar com a Lucy Dacus e a Julien Baker no boygenius, foi o clímax. Ao menos eu achava, né? Até ouvir seu segundo e novo disco “Punisher”, lançado em junho desse ano. Claramente mais uma obra prima dessa mulher. Bridgers sabe fazer sad songs como ninguém, abordando os mais variados temas. De relacionamentos (que deram ou não certo) a coisas que aconteceram durante suas turnês, aqui temos narrativas sobre diversos aspectos de sua vida, sempre com um humor meio sombrio e muita honestidade no que diz. A sonoridade do álbum reflete a personalidade de Phoebe tanto quanto suas letras. Seus arranjos são cada vez mais minimalistas, contudo super ricos. Ela mescla de elementos do folk tradicional (como banjo e violino) com toques melancólicos a elementos levemente psicodélicos. Uma atenção a parte para a faixa que encerra o disco “I Know The End” é fenomenal e me lembrou demais as grandes canções do Sufjan Stevens.

Destaque para as faixas: “Garden Song”, “Moon Song” e “Graceland Too”.

“Monovision” – Ray Lamontagne

Encerrando a lista com chave de ouro, temos ele Ray Lamontagne que fechou o primeiro semestre de 2020, lançando o oitavo álbum de sua carreira. Intitulado “Monovision”, o trabalho de dez faixas é auto-produzido e conta com os elementos clássicos que faz um álbum do Ray ser um álbum do Ray: baladas românticas, dedilhados, vocais suaves, narrativas de uma alma desnuda em canções e aquela atmosfera quase que cinematográfica. Não há grandes novidades nesse disco, não já grande inovações, apenas o autêntico Ray Lamontagne fazendo o que faz de melhor: enchendo nossos ouvidos de nostalgia e melancolia com pontadas de esperança. Uma sonoridade confortável, um aconchego para os dias em que estamos vivendo, e isso é suficiente.

Destaque para as faixas: “Roll Me Mamma, Roll Me”, “We’ll Make It Through” e “Rocky Mountain Healin’”.