Crônicas Partidas: Mar íntimo.
por Marcus Cardoso
Quando mergulhamos no mar estamos entrando no mundo. Cada gota de chuva é um minioceano que fica na nossa pele, que escorre de nossa testa, como se morasse dentro da gente. Se água fosse um sentimento, se chamaria calma. E mar seria calmaria. Mesmo nos dias de ressaca. E se tem uma coisa que amarra água e sentimento é “Gabo”, último lançamento da Crônicas Partidas, encerrando a quadrilogia de 2019.
André Passos, compositor do projeto, cruza história e conceito, como um capitão afetuoso que sabe, milimetricamente, como manejar o timão do navio. As três canções do EP conseguem, quando em conjunto, te guiar na travessia: como se te mostrasse que conhece todas as lascas da madeira do convés.
Com um início instrumental, que te leva até uma canção magnífica como “Gabo e as Gotas” e que deságua em “Escafandros”, o que nos alimenta é a história. E a gente só é o que a gente é porque contamos histórias. Afinal, sem elas não conseguiríamos repensar nossos passos, André.
A capa do álbum, essa silhueta que mergulha cada vez mais em camadas escuras de mar, nos retomam que “profundo” é tanto o oceano quanto nosso interior. E que se o inconsciente fosse físico, bem provável que seria molhado. Daí, sempre, esse som mergulhar em nós.
Enquanto ouço, lembro que todo o mundo é um fundo do mar. E o que cada nota e cada palavra me afeta é pensar que, para os olhinhos dos peixes, o navio e as pessoas nadando estão flutuando em cima do céu. Esse encerramento do projeto (que esperamos ter mais e mais novidades) tem o cheiro do sorriso que uma criança dá quando vê o mar pela primeira vez.