Não colou no Serra Folk? A gente te conta tintim por tintim o que rolou no festival

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*Por Alexandre Caetano

Foi no gramado da Vila Olímpica de Cachoeiras de Macacu, município vizinho de Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, que uma falange se reuniu para assistir a nada menos que dezesseis shows gratuitos de música folk, no último fim de semana. O Serra Folk Festival, que surgiu em 2017, homenageou nesta edição o Clube da Esquina. Nomes como Monoclub, Rafael Elfe, André Prando e Dois Varguinhas, projeto dos irmãos Ivo Vargas e Júlia Vargas, rechearam o line-up da terceira edição do evento.

Bem ao lado do pórtico da cidade, que dá boas-vindas a quem chega ao “paraíso das águas cristalinas” pela primeira metade da RJ-116, um banner convidava os transeuntes a três dias de shows e atividades. A um par de metros dali, dentro da Vila Olímpica, estava instalada toda a estrutura do festival, desde as várias barraquinhas de comes e bebes até o palco.

Marcado para as 19h de sexta, o primeiro show contou com os garotos da banda cachoeirense Voltando para Saturno, que mostraram que a molecada local manda muito bem. Quem aportou no palco em seguida foi a paraense Nathália Lobato, do projeto Versos Polaris, adepta do formato voz e violão (aliás, que voz e violão!). Paulo Ohana, de Brasília, foi a terceira atração da noite. De óculos e bigodinho, ele entregou ao público a sua versão pessoal e intransferível de “Lamento sertanejo”. Gilberto Gil aprovaria sem nem pestanejar.

Quando o carioca radicado em São Paulo Rafael Elfe, que já passou pelos principais festivais de folk do país, subiu ao palco do Serra, o público já parecia devidamente iniciado. Durante a apresentação, houve na plateia quem se rendesse a passos menos contidos, que culminaram num bom arrasta-pé no show do Monoclub, atração seguinte.

O grupo sorocabano levou para a Vila uma mistura dançante e muito bem-acabada de sonoridades americanas. No auge da performance, o público estava inteiramente entregue ao bailarico. A essa altura, aliás, o frio tinha ido quase todo embora – a ponto de, pasme, parte da galera se desagasalhar.

Foto: Nathália Mourão

Destaque da noite, a banda paulista, que meteu o pé na estrada faz pelo menos oito anos, já passou por diversos países. O compacto “Camino Cortado”, lançado este ano, é uma boa introdução ao som dos caras, cujas referências vão de Hank Williams a Los Destellos – a compilação “Sicodélicos” (2016) é uma sugestão e tanto pra quem não conhece estes últimos.

Depois do show, fora do palco, as pickups de Erikson Miranda e Francis Feliciano, do Projeto Brasis, nos brindaram com o melhor da música brasileira. Dançar pra não dançar.

No sábado, as coisas começaram cedo, lá no camping, instalado em Boca do Mato. Rolou um bate-papo às 14h, ciceroneado por Viviane Lugão, sobre empoderamento e direito da mulher. Às 15h, foi oferecida ao público uma oficina de danças populares com Giovanna Lo Bianco. Filipe Gonçalves, idealizador do festival, mediou às 15h o bate-papo “Produzindo o Serra Folk”. Atividades como essas, relacionadas a cultura e meio ambiente, fazem parte da proposta do evento desde que ele veio ao mundo, há dois anos.

Os shows só foram começar às 19h, como na noite anterior. Luísa Lacerda e Renato Frazão, dois fofos, subiram ao palco primeiro. Foi um esquenta à altura da noite principal do evento. A carismática Lívia Mendes, outra paraense, encantou todas e todos com suas madeixas cor-de-rosa e voz potente. A dobradinha Wood e Boaventura, que se apresentou depois, presenteou o público com boas referências do Clube da Esquina.

Aguardadíssimos, os irmãos Ivo Vargas e Júlia Vargas, que formam o projeto Dois
Varguinhas
, foram a penúltima atração. Júlia, considerada por Milton Nascimento, por quem é apadrinhada, um dos nomes mais promissores da música brasileira, cantou a plenos pulmões, como lhe é característico. Sua interpretação de “Canoa, canoa”, de seu grande entusiasta, foi um dos momentos mais antológicos do festival. Avacanoê.

O show de encerramento foi oferecido pela banda local Camarada Matagal, que soube manter os ânimos da galera elevadíssimos. Num dos momentos mais lisérgicos de todo o festival, a banda conseguiu a proeza de fazer o público, que insistiu em se amontoar bem perto do palco, dar as mãos e abrir uma roda. Das boas histerias coletivas da vida. Podemos dizer, por sinal, que o que o grupo faz é música folk elevada à enésima potência, em todo o seu poder de unir as pessoas umas às outras e ao ambiente ao seu redor. A noite deixou gostinho de quero (e preciso de) mais.

E teve, desde as 14h do dia seguinte. A primeira atividade do domingo foi justamente com a trupe do Camarada, que deu à galera uma oficina de luteria criativa. Quem participou se sentiu um pouquinho mais impelido a produzir, mesmo que naquele esquema de guerrilha, seus instrumentos musicais. O gaúcho Marco Gottinari, em quem se nota toda a sapiência da vida na roça, falou ao público sobre PANCs (Plantas Alimentícias Não Convencionais).

Rafael Bessa, de Nova Friburgo, abriu a leva de shows do terceiro e último dia do Serra. Mais um adepto do formato voz e violão (e ele não precisou de mais do que isso pra mandar muito, muito bem). Tainá Garmendia veio em seguida: riffs de guitarra unindo-se a letras provocativas. Janderson Ribeiro e Rodrigo Garcia levaram a viola caipira pro festival, mostrando que a roça é folk, sim, senhor.

Jhasmyna e Lucas Fidelis se apresentaram em seguida. O show da dupla contou com várias participações, mas a principal foi a de Gottinari, que chegou ao palco da única forma possível para um ermitão: escalando a lateral oposta à da escada.

A dupla Agatha e Gui Fleming começou o show trocando os próprios nomes: Agatha era Gui, Gui era Agatha. Subverter e provocar, aliás, é o que eles fazem como poucos. Quem encerrou o festival foi André Prando, músico capixaba muito proeminente na cena folk nacional.

Foto: Nathália Mourão