“Stand-Up Drama”: um álbum para refletir o lado agridoce da vida
por Maísa Cachos
É sobre o lado agridoce da vida. Os altos e baixos. A dor e a delícia que Caetano uma vez disse que cada um é que sabe como é sentir na própria pele. Toda essa dualidade da vida adulta é tema de “Stand-Up Drama”, o disco de estreia do duo Feito Café.
Estreia em álbum completo, né? Afinal, o projeto encabeçado por Letícia Pacheco e Hugo Oliveira já soma aí uns sete anos de estrada, com muita bagagem e história pra contar. Eu fico pra lá de feliz em acompanhar essa jornada há alguns anos. Em 2018, comentamos aqui sobre o primeiro EP que eles lançaram. Intitulado “Barbacena”, o trabalho resgata em suas canções a viagem onde tudo surgiu.
De lá pra cá, o duo vivenciou muitas experiências de palco, inclusive organizando eventos como o Caminhos do Folk, que tem uma proposta incrível de recriar a Trilha do Ouro, desta vez em busca de preciosidades da música autoral e independente no Brasil.
Para além disso, vieram outros lançamentos, como o single duplo “Compactando o Agora”, lançado em 2020, em meio ao caos da pandemia do Covid-19. Ali, já era possível observar a evolução musical da dupla. Amadurecimento em letra e melodia, Além de uma mensagem sensível e para lá de marcante para o período que estávamos todos vivenciando.
Pois bem, chegamos em 2021 e somos surpreendidos com mais uma bonita novidade desse duo. E a palavra é surpresa mesmo. Como já disse, acompanho a dupla desde o primeiro EP, tenho notado sua evolução e acredito muito na criatividade desse casal, mas ainda assim não esperava um álbum tão bom. Sou sincera.
Vamos começar pelo tema do trabalho. “Stand-Up Drama” não tem um conceito em si, mas basta ouvir duas ou três faixas para sentir a atmosfera que o circunda. Sobre isso, Hugo reflete: “Apesar de não ser um disco absolutamente conceitual, as músicas acabam conversando, tratando de sentimentos e emoções comuns a todos aqueles que, mesmo com as porradas e obstáculos que aparecem, precisam ficar plenos, em pé, no palco da vida”.
E é isso mesmo. Ao longo das nove faixas, ouvimos sobre os problemas da vida, sobre as responsabilidades de sermos adultos e termos que aguentar todas as barras possíveis, despedidas, inseguranças, saudades, amores e, também, política. Aliás, a faixa “Aquele Amor”, tem uma letra totalmente pertinente: “direita, esquerda, centro, extremos, anarquia / tudo quanto é ideologia temperada a fake news”. Convenhamos, isso ultimamente tem representado mais o Brasil que futebol e samba. É triste, mas é fato.
Ainda falando sobre “Aquele Amor”, esse arranjo é um dos meus favoritos nesse trabalho. Para embalar essa narrativa que viaja entre amor e política, temos uma pegada folk maravilhosa, com um banjinho que não pode passar despercebido de modo algum.
O álbum num todo, apresenta muitos elementos. Vai do indie pop à MPB, com aquela atmosfera vintage, que, ao menos para mim, sempre foi muito perceptível na música do Feito Café. Mas quando eles decidem mergulhar no folk, eles vão fundo. É o caso de “Num Dia Como Outro Qualquer”, minha faixa favorita do trabalho, graças aos seus acordes e aquela batidinha tipo footsteps. A melodia tem ainda uma ambientação meio faroeste. Sério, essa música tem uma p*ta de uma vibe.
Evidencio ainda a canção “Triste de Quem”, com acordes belíssimos e destaque para a harmonia vocal do duo. Aqui, temos um folk mais Simon & Garfunkel, com uma sonoridade bem mais poética. Algo parecido com o que acontece também em “Santuário Interior”. São momentos mais tranquilos do trabalho, podemos dizer assim. Sendo essa segunda um bocado mais densa. Essas duas são daquelas faixas nas quais paramos para prestar mais atenção no que elas dizem.
Não posso deixar de comentar também sobre o single “Parece”, que encabeçou a divulgação desse lançamento, com uma mensagem sobre a vida do artista independente brasileiro. Sua letra reflete sobre as incertezas da vida artística e os aprendizados diante das dificuldades. Se ouvi-la não fosse o bastante para compreender esse cenário precário, experimente assistir ao clipe.
Preciso elogiar ainda a evolução vocal do duo, além de seu progresso nas composições. É nesse trabalho que Letícia aparece como letrista pela primeira vez (na música “Caminho”). Também não posso deixar de citar a parceria de Cecel Alves, que divide a composição com Hugo em uma das faixas e o guitarrista Rick Ferreira que participa do disco em duas faixas, tocando pedal steel e banjo. Tudo isso sob a produção de Clower Curtis.
Bom, acho que já dei motivos suficientes para você que está lendo essa resenha ouvir este trabalho. Agora só posso deixar aqui o link e desejar-lhe uma excelente audição.