Um reflexo névoa em Matt Eliott

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Uma travessia. Uma neblina densa. Um carro. Veloz e grande. Em movimento. Pessoas atravessando. Um número grande. Uma travessia de cegos pela ocasião. Do carro só é possível ver seu vento. A névoa não deixa cicatriz, anuncia um poema do Leonard Cohen. Não deixa mas causa. Matt Eliott, em seu lançamento mais recente, nos impõe essa névoa. 

“Farewell to All We Know”, o disco em questão, fala de hoje: essa névoa que está, dia após dia, nos fazendo mudar. E, como diz o título do disco, nos despedir de tudo o que conhecemos. A sensibilidade do músico inglês é impressionante: cada canção sobreposta uma na outra, entranhadas em seus ossos. Um disco minucioso que diz sobre e para todos. E, como se puxássemos uma corda, cada disco atrás dele é um mergulho dentro de outro (ouçam, sem hesitar, pelo menos esses: “The Calm Before”, “Drinking Songs” e “Only Myocardial Infarction Can Break Your Heart”).

O disco é uma daquelas obras para ser consumida-devorada-deglutida desde seu segundo inicial: afinal, essa é uma das coisas: como Eliott consegue te ambientar em um conceito. Ouvindo é possível tocar o abstrato. E ele te cerca, lentamente, até o bote. E um dos botes é dado na canção “The day after that”. Um bote brilhante. Um bote preciso. Um bote coheniano, inauguremos o termo. Estejam preparados e não se protejam:

O disco todo, apesar dos tons pessimistas, nos engrandece: pois justamente reconhece que ainda existe alguma coisa após: o que ele aponta é que a forma como vivemos o mundo e o conhecemos bateu na parede do fracasso: e é preciso repensar. Recompor. Resignificar. É preciso Re.

Matt Eliott soará por muito tempo ainda conosco: Nos deixando cegos com intuito de mostrar nossa cegueira. Um Saramago da canção. Um cientista do sensível. Um artista completo.