Iron & Wine até e muito mais que “Our Endless Numbered Days”
por Pedro
“Sonhadores e realizadores são o meu tipo favorito de pessoas” – Sam Beam.
Em meados dos anos 2000, Sam Beam era um cara inquieto. Vivia procurando um hobby pra ocupar a cabeça enquanto trabalhava de garçom para pagar a faculdade de artes, a mesma onde se especializou em pintura e cinema em Richmond, Virginia. Se tornou professor assim que se formou e a música era um desses hobbies: se dedicava a compor como um exercício para a sua criatividade e assim o fez por sete anos, até que um amigo emprestou um gravador 4-track para registrar esses devaneios. Esse foi o embrião do seu projeto musical Iron & Wine, o que Sam não fazia ideia é de tudo o que aconteceria para ele dali por diante.
Uma vez que terminou suas primeiras gravações, resolveu mostrar para o amigo, Michael Bridwell, que, por sua vez, mostrou para seu irmão Ben. MUITA CALMA NESSA HORA: Ben Bridwell não é o vocalista do Band Of Horses? O próprio! Ele ouviu e amou as músicas, mais tarde resolveu mostrar para um curador da Yeti Magazine que lançou uma das faixas em um compilado da revista. Essa faixa, “Dead Man’s Will”, chamou a atenção da Sub Pop Records (selo de Seattle que tem no seu catálogo nomes como Nirvana, Soundgarden, The Shins, The Postal Service e o próprio Band Of Horses), que contactou Beam para um acordo.
“The Creek Drank The Cradle” foi lançado em 2002 e resultou numa pequena turnê para a promoção de vendas. Recebido calorosamente pela crítica especializada, Sam logo voltou para casa e resolveu trabalhar em novas músicas. Dois anos depois lançaria o que muitos consideram sua obra intocável e definitiva: “Our Endless Numbered Days”.
O disco completa quinze anos de seu lançamento em 2019 e só agregou importância para a carreira do trovador barbudo desde então. Trocando o seu porão e o antigo gravador por um estúdio em Chicago com uma banda completa o acompanhando, Beam acrescentou sofisticação nos arranjos – ainda que todos eles destaquem voz e violão – e clareza cristalina na captação do som. Inicialmente, isso afugentou alguns fãs que preferiam o lo-folk do disco prévio, mas a mudança foi bem vista no geral.
As composições recheadas de metáforas lamentam a mortalidade, vulnerabilidade, saúdam o amor e o efêmero, dão significados a pequenos detalhes da vida diária por um viés bucólico. Fé e lealdade são colocadas à prova, confissões perversas são docemente ditas e, ainda assim, Sam nos dá espaço para vagar entre esses versos e as possíveis histórias por trás deles.
Apesar de ser o segundo lançamento de Iron & Wine, o disco se tornou a porta de entrada para o artista devido ao sucesso comercial e utilização de suas faixas em várias séries e filmes. Felizmente, a fórmula não se tornou regra e seus lançamentos são sempre uma incógnita: os três próximos discos o transformaram em um artista não só do folk, mas do experimental e progressivo. A sonoridade de “Our Endless” só seria revisitada em 2016 no álbum “Beast Epic”, mas as similaridades param por aí.
Sam Beam é um cara tranquilo, a típica figura de um senhor casado e pai de cinco filhas que não queria ser famoso e, por acaso, construiu um legado como um dos maiores nomes do folk dos últimos anos para aqueles que, assim como ele, procuram criar e reconhecer toda beleza e mistério que há em viver. Viva os inquietos!